segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Desajuste em Curral Del Rey – Parte II

No caminho Fred observava super irritado como estavam emporcalhadas as ruas, com latas de refrigerante atiradas no passeio*, copinhos de sorvete rolando no meio-fio, panfletos comerciais melados no bueiro presos ao óleo que escorria de alguma oficina e embalagens diversas capotadas no asfalto.

Não queria saber de olhar o movimento, casas, novas lojas, tampouco os carros importados que em outras ocasiões eram alvo garantido de seu contemplar.

Ao descer o viaduto, o moço de rosto quase colado no vidro e ainda cabisbaixo se deparou com um pôster de futebol amassado – provável encarte de algum jornal – e... daí lhe ocorreu a lembrança que naquela semana o Cruzeiro derrubara o favoritaço Palmeiras na final da Copa do Brasil. Acontecimento que para o coração alvinegro de Fred era bem amargo, mas cujas circunstâncias – e aí basta ver como a partida foi – ao seu intelecto já começavam a enviar a lição winstonchurchilliana do nunca desistir.

Voltou do Centro, trazido por Carlos, desta vez calculou não dar tempo de passar em casa, apressou-se em chegar ao Tiradentes, colégio onde estudava, também em Stª Tereza.

Na manhã seguinte Lu(como era chamado nosso herói de nome composto pelos familiares em casa quando estes se viam cansados demais para chamá-lo pelo prenome, ou exasperados ou mesmo aéreos) foi entregar uma pilha de roupas em cinco casas diferentes. E como estas ficavam pertinho uma da outra, ele foi a pé mesmo – enquanto Carlos ia visitar alguns clientes na Esplanada – deixando a pilha atrás do balcão de um nostálgico e modesto bar na Rua Salinas.

Agachou-se Lu virado de frente para o barril de chope artesanal, ao lado e a cerca de um metro e noventa do lugar onde Sô Gumercindo**, o dono, abria a portinhola de vidro e distribuía as que de madrugada haviam chegado côxinhas numa travessa. O entregador tinha o intuito de separar um jogo de blusas para a primeira casa situada atrás da Pracinha, um pouco mais afastada das outras, além do Oásis inclusive.

Rodeados estavam os dois, sem fregueses naquela quinta-feira às 8:09, por um conjunto de azulejos em dourado e vinho; na parede contígua ao balcão surgia colocado pelo filho do Sô Gumercindo um quadro da banda Os Mutantes no qual predominava a côr creme abrigando em baixo seu psicodélico marrom-escuro logotipo que há vinte e três anos esteve na moda e em cima seus componentes desvairados e de rostos felizes; na parede oposta ao balcão víamos uma prateleira de salgadinhos cujas gavetas quadradas em grade nos lembravam uma cestinha da Caloi fabricada nos anos 80, mesmo decênio da plaquinha ainda ostentada e parafusada à grade, indicando o produto Bocaditos com sua logomarca oitentista onde ferrugens pequenas se podiam notar.

* N.A.: no resto do Brasil acho que se diz calçada, porém em Belo Horizonte se diz passeio.

** N.A.: acho que em todo o resto do Brasil é Seu Gumercindo mesmo.

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